quinta-feira, 3 de abril de 2008

SALVE, SALVE!

Por Cláudio Munhoz

Pátria amada, mãe gentil... Longe vai o Carnaval, mas a folia corre quente nas veias. Antes era apenas circo, com trapézio e picadeiro; hoje, tem-se pão também. “Pão e circo”, bendita herança dos tempos de Roma, o antigo Império. E, nessa corda bamba, caminhamos nós, felizes e risonhos, de alma lavada e barriga quase cheia (ou meio vazia?). Isto aqui é o paraíso!

No entanto, cuidado! Expor-se ao Sol de um novo mundo pode causar insolação, febre e delírio. Afinal, quem nunca ouviu que este é o país do futuro? Até aí, tudo bem. O problema começa quando alguém, já no final da vida, confortavelmente sentado à beira do caminho, descansando à sombra de uma árvore, se dá conta de que essa singular profecia se arrastará por muitas e muitas gerações sem que se faça cumprir. Bingo! Mais uma vítima do conto do PAC, melhor dizendo, do paco.

Ainda bem que somos um povo heróico, com brado retumbante e braços fortes. E quem não haverá de suportar em silêncio o peso de uma sina tão robusta? Para isso, todavia, há que se ter fé, resignação, coragem e, obviamente, uma dose cavalar de alienação.

Se a esperança é a última que morre, eis que no Parlamento e nos palácios, as Excelências, minhas e Vossas, definem em tom solene os rumos da prosa e dos gastos públicos. “É mister que venham escândalos...”, afirma um incauto da tribuna, em defesa das instituições. “Isso está na Bíblia!”, aparteia um correligionário não menos incauto. Pena que ambos não leram o versículo inteiro. Mas a culpa é do assessor. Sempre será. Também, quem mandou não freqüentar a igreja? Alguém poderia até pensar: “Se uns não costumavam ir à igreja, outros, por sua vez, deixaram de lado a escola.” Pois é! E daí? Não faz a menor diferença. Com um certo jeitinho, dá para sentar no trono com o primeiro grau incompleto. Tudo é uma questão de oportunidade.

Enfim, depois de muitas andanças, e já sem tanta esperança, repousa minha carcaça de quase meio século em berço esplêndido, ao som de axé e funk e à luz fosca do céu cinza-chumbo do progresso. Tudo com bastante ordem, inspirada, talvez, pela sabedoria de um certo gênio da administração pública que encontrou nos rios, lagoas e praias a solução para o destino das fezes urbanas, enquanto as florestas ardem em chamas nos rituais sagrados da cupidez humana. Mas que não venham sobre mim os abutres e as hienas, pois que ainda não é chegada a minha hora. Tenho muito que apodrecer, abraçado à minha velha e ressequida utopia.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

POESIA DO INSTANTE

Por Cláudio Munhoz

Quanto de amor trazes na alma e que de ti faz transbordar um oceano de mistérios? Que segredos pode o Universo preservar, se teu olhar esparge a energia pulsante de incontáveis estrelas?

Pousado em ti, meu pensamento projeta imagens dos versos que teus lábios retêm, pois que a virtude dos anjos te fez poetisa. Mas se nesse inquietante silêncio tua voz ao menos reproduzisse o murmúrio súplice de um riacho, meu desejo de amar-te celebraria solene a sublime poesia deste instante.